É muito comum, mesmo entre os operadores do direito, confundir os delitos de calúnia e denunciação caluniosa. Embora esses dois crimes tenham uma relação muito próxima, comportam muitas diferenças, inclusive na pena cominada, que é muito mais gravosa no caso da denunciação caluniosa.
O crime de calúnia atinge o bem jurídico “honra” e é descrito no art. 138 do Código Penal, in verbis:
Art. 138 – Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime: (grifado)
Pena – detenção, de seis meses a dois anos, e multa.
Cuida-se do mais grave entre os crimes contra a honra, com penas mais alta que a difamação e a injúria.
Para que se configure o crime de calúnia é preciso que a imputação seja de um fato definido como crime. Exemplo: Tício caluniou Mévio, dizendo que este roubou seu telefone celular.
O ato de roubar constitui crime, previsto no art. 157 do Código Penal (subtrair, para si ou para outrem, coisa móvel alheia, mediante violência ou grave ameaça), portanto, o crime de calúnia restou configurado. Se Tício tivesse imputado a Mévio algum fato desabonador, mas que não fosse definido como crime, restaria configurado o crime de difamação e não de calúnia.
A calúnia também resta configurada se alguém, sabendo ser falsa a imputação, a propaga. Por exemplo, Tício ouviu Mévio dizer que Agripina ameaçou causar mal injusto e grave a Caio, mesmo sabendo que Agripina nunca chegou a fazer isso. Assim, Tício também comete crime de calúnia contra Agripina, na forma equiparada.
Cumpre destacar que o crime de calúnia é doloso, não admitindo a forma culposa. Ou seja, só se pune a calúnia se o autor do fato sabia que a vítima era inocente, que não cometeu crime nenhum. Além disso, admite-se a exceção da verdade, que é quando a suposta vítima de fato praticou o crime que lhe foi imputado.
Só não se admite a exceção da verdade em três situações:
I – se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível;
II – se o fato é imputado ao Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro;
III – se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível.
Discute-se se é possível a configuração do crime de calúnia na forma tentada, pois este crime se consuma a partir do momento em que terceiros ficam sabendo da falsa imputação, mesmo que não chegue a de fato abalar a honra do ofendido. A doutrina admite a tentativa na hipótese de o crime ser cometido mediante carta que não chegue ao destinatário, por exemplo.
Por fim, insta salientar que o crime de calúnia é de ação penal privada, de modo que só se procede mediante queixa.
Por sua vez, o crime de denunciação caluniosa é de ação penal pública incondicionada à representação, pois trata-se de um crime contra a administração da justiça e a pena cominada é mais alta que a da calúnia. Embora também afete a honra da vítima, esse bem jurídico é atingido de maneira mediata.
Art. 339. Dar causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente:
Pena – reclusão, de dois a oito anos, e multa.
O crime de denunciação caluniosa é mais grave que o de calúnia, pois não se resume a apenas imputar falsamente fato descrito como crime, nesse caso o infrator movimenta a máquina estatal para iniciar um procedimento investigativo contra alguém que sabidamente não fez nada. Por isso é punido mais severamente.
Assim como a calúnia, o crime de denunciação caluniosa é doloso, não admitindo a forma culposa. E a denúncia caluniosa deve dizer respeito a fato definido como crime, contravenção ou infração análoga, punida civil ou administrativamente.
O crime se consuma a partir do momento em que têm início as investigações ou os demais procedimentos dispostos no caput do art. 339 do Código Penal.
Há controvérsia quanto à necessidade de a vítima ser inocentada, por meio de uma sentença ou arquivamento do inquérito, por exemplo, para que o Ministério Público possa processar o denunciante. Contudo, o entendimento predominante é de isso não é necessário. Nesse sentido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, confira-se:
“A alegação de que seria indispensável o arquivamento formal do inquérito policial indevidamente instaurado, para só depois se processar o crime de denunciação caluniosa, não merece prosperar, quando evidenciado que foi no próprio inquérito policial instaurado para apurar o crime de abuso de autoridade, indevidamente imputado à vítima, que se verificou tratar-se de atribuição falsa de crime a pessoa sabidamente inocente.” ((RHC 50.672/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 18/09/2014, DJe 07/10/2014) (Grifado)
Também se discute se há a possibilidade de tentativa no crime de denunciação caluniosa. O entendimento que prevalece é de que é possível a tentativa quando a investigação não é instaurada, mesmo depois de ter sido feita a denúncia caluniosa.
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